Leia o Artigo de Divulgação Científica:
Por que sentimos água na boca?
“Chiquinha, o
almoço está pronto! Fiz a batata frita que você pediu!”
Só de ouvir essas palavras, sua boca se enche d’água – de saliva –,
antecipando-se à comida que já vai entrar na boca e precisar ser digerida. De
fato, a digestão começa na boca, onde os alimentos são picados, triturados e
esmagados, tudo isso antes de serem conduzidos ao estômago. E pasme: se a boca
não se enchesse de saliva, não seria possível nem engolir o alimento, nem saber
o que você tem sobre a língua!
Todo mundo produz uma pequena quantidade de saliva o tempo todo, mas a
produção aumenta quase dez vezes quando uma pessoa vê, cheira ou pensa em
comida.
A saliva que enche a boca nessas horas é essencial por várias razões.
Primeiro, somente quando dissolvidos na saliva é que pedaços microscópicos
desprendidos dos alimentos chegam até as papilas gustativas, que sinalizam ao
cérebro o tipo de comida que você tem na boca: água, sal, ácido, doce,
proteína, ou algo amargo e, portanto, potencialmente nocivo, nada bom de ser
engolido. Assim, além de reconhecer o alimento pelo gosto, o seu cérebro já vai
preparando o corpo para a digestão. Segundo, a saliva contém enzimas que
começam a partir em pedaços menores os carboidratos, grandes moléculas de
açúcar como o amido do pão.
Além disso, é a saliva que umedece e dá liga aos alimentos triturados e
permite que eles sejam transformados em um grande “bolo” compacto e lubrificado,
que pode ser engolido sem risco de engasgos. Se você não acredita que comida
seca não desce sem saliva, experimente o famoso “Teste da Bolacha”: comer três
biscoitos em menos de um minuto, sem apelar para um copo d’água. É simplesmente
impossível! A razão é que, mesmo trabalhando dez vezes mais rápido, as
glândulas parótidas e salivares não conseguem produzir saliva com a rapidez
necessária para que os pedaços de biscoito passem em menos de um minuto de
paçoca a uma massa umedecida que possa deslizar até o seu estômago.
A boa notícia é que a produção de saliva é automática, comandada pelo
sistema nervoso autônomo sempre que o cérebro detecta a presença de comida na
boca. O interessante é que, por associação, também funciona pensar em comida,
sentir o cheiro bom do almoço no fogo e até ouvir que ficou pronto aquele prato
de que você gosta. O caso mais famoso de água na boca por associação, claro, é
o já lendário cão do fisiologista russo Ivan Pavlov. De tanto ouvir um sino
tocar antes de receber sua comida todos os dias, o animal passou a salivar em
resposta ao tocar do sino, mesmo que o prato demorasse a chegar. E eu, de tanto
escrever sobre comida, já fiquei com água na boca...
Suzana Herculano-Houzel
Departamento de Anatomia,
Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Revista CHC | Edição 199.
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